revelado os reias motivo do Império na intervenção na Líbia

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[Robert Morgan] 27 de julho de 2011. Telegramas diplomáticos americanos divulgados pelo WikiLeaks expõem os reais motivos e as tensões diplomáticas por trás do bombardeio da OTAN (Organização do Tratado Atlântico Norte – N.T) que ocorrem à Líbia. Longe de iniciar uma intervenção “humanitária” para proteger civis contra o governo de Muammar Kadafi, Washington apoiou a intervenção da OTAN por uma única razão: a instalação de um regime que melhor servisse aos interesses estratégicos dos Estados Unidos, bem como as operações das gigantes do petróleo e companhias de gás.


Os telegramas datam de 2007, aproximadamente três anos depois da administração Bush impor sanções e formalmente restabelecer relações com o regime de Kadafi, na busca por garantir acesso a recursos líbios altamente valorizados. Até a eclosão de levantes revolucionários em todo o Oriente Médio neste ano, Kadafi era recebido de braços abertos em Washington e internacionalmente.

Como os documentos mostram, em agosto de 2009, o senador Americano John McCain liderou uma delegação no Congresso, de caráter bipartidário, para encontrar Kadafi. McCain caracterizou o “andamento geral das relações bilaterais como excelente”. O senador Joe Lierberman disse “nós nunca poderíamos ter imaginado, há 10 anos, que estaríamos em Trípoli, sendo recebido pelo filho de Muammar Kadafi”, antes de ter a Líbia como “um importante aliado na guerra contra o terror”.

Não é surpresa alguma que os telegramas se refiram ao “potencial de produção de hidrocarboneto” da Líbia e a “grande expectativa” entre as companhias internacionais de petróleo. De forma significativa, o regime de Kadafi estendeu a Washington a perspectiva de maior riqueza. De acordo com um telegrama de 2009, o então chefe interino da Corporação Nacional do Petróleo da Líbia, Ali Sugheir, disse à embaixada dos Estados Unidos que as principais “bacias sedimentares de recursos petrolíferos foram descobertas na Líbia”, com dados sísmicos indicando “muito mais do que tem sido descoberto em todo o país.”.

A disputa entre dezenas de companhias internacionais de gás e petróleo para lucrar com a instituição das sanções, no entanto, logo produziu dois grandes problemas para o governo americano. Primeiramente, nas palavras de um telegrama de 2007, “nacionalização dos recursos da Líbia” – políticas destinadas a aumentar “o controle e participação sobre a receita dos recursos de hidrocarboneto” por parte do governo líbio. O documento conclui que os Estados Unidos deveriam demonstrar “a clara desvantagem” de tal prática.

A política de Kadafi forçou as companhias de gás e petróleo a renegociar seus contratos de acordo com essa última versão do Acordo de Participação na Produção e Exploração Líbio (EPSA IV – do inglês Exploration and Production Sharing Agreement – N.T). Entre 2007 e 2008, muitas companhias como EXXonMobil, Petro-Canadá, Repsol (Espanha), Total (França), ENI (Itália) e Occidental (Estados Unidos) foram compelidas a assinar novos acordos – em condições significativamente menos favoráveis que as anteriores – e foram coletivamente obrigados a pagar US$ 5,4 bilhões em “bônus”.

Um telegrama de 2008 diz que o Oasis Group – incluindo as empresas americanas Conoco Phillips, Marathon e Hess – seria a próxima do bloco, apesar de já terem pagado US$ 1,8 bilhões em 2005. O documento questiona se a Líbia pode ser confiável nos sentido de honrar novos contratos da EPSA IV, ou voltaria a “propor um corte maior”.

O documento ainda discute as implicações mais amplas dos contratos da EPSA IV. Enquanto os contratos foram “amplamente generosos” para as companhias de óleo, que era pra fazer “muito mais dinheiro por barril de óleo produzido”, a ameaça de renegociação forçada criou um precedente internacional perigoso – um “novo paradigma para a Líbia que está jogando com todo o mundo que está num número crescente de países produtores de petróleo”.

As gigantes do petróleo e o governo americano ficaram alarmados pelas ameaças feitas por Kadafi, em uma vídeo-conferência feita em janeiro de 2009 aos alunos da Universidade de Gerogetown, de nacionalizar a indústria de gás e petróleo. Um telegrama de janeiro de 2010 relata que “o discurso do regime no início de 2009 de possível nacionalização do petróleo... colocou a questão novamente à tona.”.

Kadafi também forçou as companhias internacionais de petróleo a contribuir com o as Reivindicações do Acordo de Compensação entre Estados Unidos e Líbia. Assinado em agosto de 2008, o acordo estabelece a criação de um fundo para assistência a vítimas de atentados envolvendo os dois países. Dois telegramas de fevereiro de 2009 reportam que a Líbia apresentou um ultimato às companhias de petróleo: contribuem para o fundo ou “sofrem sérias consequências.”. O presidente da Companhias Nacionais de Petróleo, Shurki Ghanem, referiu-se explicitamente às ameaças feitas por Kadafi de nacionalizar a indústria do óleo. O embaixador americano alertou que “pressionar as companhias americanas foi ‘cruzar a linha vermelha’”. Ele “pediu a Ghanem e seus colegas para considerarem a relação de longo prazo com os Estados Unidos.”.

A segunda consequência indesejada da aplicação de sanções era que isso permitia à Líbia desenvolver relações mais próximas com rivais americanos, notavelmente na Europa, China e Rússia. Um telegrama de junho de 2008 descreve um “recente interesse na Líbia por parte de empresas de petróleo não ocidentais (particularmente, da Índia, Japão, Rússia e China), que venceram a maior parte das concessões das áreas petrolíferas recentemente encontradas”.

Um telegrama de 2009 descreve como o primeiro ministro italiano, Silvio Berlusconi, assistiu à ratificação do tratado de “amizade e cooperação” entre Líbia e Itália, segundo o qual a Itália teria de pagar US$ 200 milhões por ano durante 25 anos como compensação por “danos de colonização”, em troca da garantia de “preferências por companhias italianas para desenvolvimento de projetos”. Um oficial italiano contou à embaixada americana que os principais interesses da Itália em relação à Líbia era “óleo, óleo, óleo e migração.”.

A crescente presença da China também gerou preocupação. De acordo com um telegrama de fevereiro de 2009, a China Railway foi premiada com um contrato de US$ 805 milhões e outro de US$ 2,6 bilhões um ano antes. Um telegrama de maio de 2009 diz que Kadafi contou ao comandante da União dos Estados Africanos, o comandante geral William Ward, que a “China tem preferência” na África “porque não interfere nos assuntos internos”. Um telegrama de setembro de 2009 diz “companhias chinesas esculpiram alguns nichos por si mesmas no mercado líbio, mais exatamente no setor da construção civil e das telecomunicações”.

Vários telegramas apontam para uma aproximação entre Líbia e Rússia. Em abril de 2008, o presidente russo, Vladmir Putin, teria voado para a Líbia, acompanhado por 400 assistentes, jornalistas e executivos, para assegurar um “acordo para negociar uma dívida Líbia de 4,5 bilhões de dólares da época da URSS com a Rússia” em troca “de um contrato de ferrovia e muitos outros futuros contratos na área da construção civil e desenvolvimento de projetos no setor de energia”. Vários memorandos de entendimento foram assinados com a gigante de eletricidade russa, Gazprom. No encontro, Kadafi expressou oposição à expansão da OTAN para a Ucrânia e Geórgia, questões sensíveis para a Rússia.

Mais significativamente de uma perspectiva estratégica americana, Kadafi aparentemente “anunciou sua satisfação em relação ao aumento do poderio russo servir como um contrapeso necessário ao poder americano, ecoando o apoio do líder líbio a um mundo multipolarizado.”.

Neste contexto, os Estados Unidos cultivaram relações com certas figuras do regime de Kadafi e, secretamente, discutiram os benefícios de tirar Kadafi de cena. Um telegrama de 2008 relata como Ibrahim el-Meyet, um “amigo íntimo” de Ghanem (e uma fonte de “proteção estrita”) contou à embaixada americana que Ghanem e ele “concluíram que não haveria um reforma econômica ou política real na Líbia até que Kadafi saísse da cena política”, e isso “não aconteceria enquanto Kadafi estivesse vivo.”

Outro telegrama de janeiro de 2009 apontava a existência de “duas linhas de pensamento” dentro o governo Líbio – uma “pró Estados Unidos e um outro grupo que suspeitava dos motivos dos Estados Unidos e perseverantemente se opôs a um conjunto mais amplo de engajamento”. Enquanto Kadafi e seus filhos aparentemente pertencerem ao “grupo pró-Estados Unidos”, Kadafi “apoiaria o aumento da cooperação Líbia-Estados Unidos, mas com ‘condições’ e isso trouxe uma preocupação de que a meta eventual dos Estados Unidos seria mudar o regime estabelecido na Líbia” (grifo da fonte).

As preocupações de Kadafi eram bem fundamentadas. Nos bastidores, as tensões cresciam com a chegada de Obama ao poder. Um telegrama de fevereiro de 2009 dizia que o governo líbio estava “temeroso de que a nova administração americana pudesse adotar políticas marcadamente diferentes em relação à Líbia”. Era uma referência aos “indivíduos poderosos da Líbia que se opuseram fortemente à melhora no relacionamento com os Estados Unidos, que estariam prestes a perder um grande negócio caso o atual sistema mudasse significativamente, e que veem os Estados Unidos como o catalisador de tais reformas”.

Os telegramas mostram que o governo dos Estados Unidos monitorou de perto a oposição política ao regime de Kadafi no lado oeste da Líbia, onde a força “rebelde” do Conselho Nacional de Transição está baseada. Um telegrama de 2008 refere-se a uma política de governo deliberada da Líbia para “manter os pobres do oeste como um meio de limitar a ameaça política potencial ao regime de Kadafi”, que levou “muitos jovens do leste da Líbia” a acreditar que não tinham “nada a perder participando da violência extremista na Líbia” e contra as forças americanas no Iraque.

As relações também foram intensificadas com elementos de dentro do governo Kadafi. Quando o Ministro das Relações Exteriores, Musa Kusa, encontrou o General William Ward em maio de 2009, ele relembrou que estava “compartilhando de sua visão frequentemente e abertamente com seus contatos americanos na Agência Central de Inteligência (CIA) e no Departamento de Estado”. Kusa fugiu para a Inglaterra em um jato particular em 30 de março deste ano.

Os vazamentos do WikiLeaks demonstram ainda mais que a intenção administração Obama para derrubar o governo da Líbia e seu reconhecimento aos “rebeldes” nada têm a ver com “ajuda humanitária”. Ao contrário, a Casa Branca está somente respondendo ao impacto desestabilizador das lutas em erupção por todo o mundo árabe, no caso da Líbia, por virar bruscamente contra seu antigo “aliado importante”.

A administração Obama tem começado os preparativos, que remonta a pelo menos em 2007, para derrubar o atual regime e tentar instalar outro, mais alinhado aos interesses americanos. Longe de proteger civis, o governo americano procurou afastar o risco de qualquer revolta genuinamente popular contra Kadafi, com base em considerações guiadas pelo grande poder de criar rivais e demandas que garantam os lucros das grandes corporações.

Traduzido para Diário Liberdade por Bruno Baader

 

TEXTO ORIGINAL EM> Dario Liberdade

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